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Foto do escritorJorge Quiros

A fase expressionista e "O Pranto inútil"; 1.10.23:


Houve uma época que queria ver na pintura uma insurreição, insurreição duma onda de sentimentos que se fazem tocar nos olhos como uma faca tocaria um pano, a sentir, assim, um rasgo, uma ranhura, um machucado; nesta época não pintava para o entendimento da imagem, pintava para incomodar os olhos e ferir o imaginário pela força da imagem plasmada na tela, não queria o belo, queria a força, não queria a compreensão da imagem, queria que esta tocassem os olhos e corações... esta época é o que costumo chamar de "fase expressionista", cujas nuances nunca me deixaram totalmente, talvez por haver algo em mim que tenda a ser absorvido nisto que é chamada pela historiadora Shulamith Behr de "Ausdruckscultur" - cultura expressionista, que em seu entender é o mesmo que cultura germânica.

Os temas que queria pintar não eram belos, eram temas duros, temas de delapidar o coração, temas, no entanto reais cujos queria trazer à tona numa espécie de voz daquilo que não se está sendo escutado, para atravessar o deserto da insensibilidade à conscientização dos interiores.


Foi nesta época que pintei "O pranto inútil", seu ano de produção foi em 2014.

Não exponho ( apesar de raramente, como agora) esta tela, a considero demasiado comovente e mesmo perturbadora, pois aquilo que ela fala é brutalmente real e atual.

Em 2014 houve os eventos na Síria e a invasão à Crimeia, promovendo nelas o terror soviético.

Hoje há a continuação destes eventos, na aterrorização da nação soberana da Ucrânia.

Mas antes houve eventos semelhantes, por serem provocados por um mesmo agressor, à Chechênia, à Geórgia, à Bielorrúsia.

Trata-se da progressão do genocídio, escalada bélica do estado terrorista soviético.

Foram estes eventos, esta guinada sangrenta e aos meus olhos na época, sem solução, que me impeliram a pintar O pranto inútil.


Na tela, uma mãe com o rosto dilacerado por pinceladas impetuosas chora, com os olhos exageradamente saltados à fora, sob o corpo inerte e pálido, quase um fantasma, de sua filha morta. O expressionismo tudo exagerava, daí tomei-lhes emprestado esta potência da expressão.

O rosto da mãe em prantos foi inspirado na feição performártica de Alpacino em "O poderoso chefão 3", performance brilhante, aonde exprime num grito e num ato, toda a condensação da dor, duma dor que dói os olhos, os ouvidos, da dor da perda daquilo que se é mais caro, duma agonia que toca no peito que se desmanchou por uma brutal ruptura existencial, Vitor Corleone nunca mais veria sua filha, a personagem de O pranto inútil, igualmente, se despedaça ante seu ente querido que se foi.

Mas o pranto da turba de pais e mães parecia ser em vão, o mundo não queria dar-lhe a mão, a solução distante parecia esgotar-se como as lágrimas ao chão.

Toda a tela jaz em vermelhidão, pintada sem preparo, sem cuidado, somente com expressão, queria dar-lhe a sensação de cortes, traduzindo pelas pinceladas de vermelho dilacerante os cortes igualmente doídos das xilogravuras de Goeldi.

Ao fundo, as botas indiferentes dum soldado, ou criminoso vestindo farda, enfim do assassino, caminham na contramão do personagem em foco, como que tendo acabado de realizar o ato da execução.

O pranto, sem remédio, sem remediação, cai ao chão.





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